Cargo Cult
2018-11-30 #code #cargo cultUm dos problemas não falados na área de T.I. é o cargo cult, mas poucos realmente sabem o que essa expressão quer dizer e de onde vem.
Esse post acompanha a minha apresentação sobre Cargo Cult.
Você provavelmente já ouviu falar da "Polinésia", onde ficam o Havaí, a Nova Zelândia e a Ilha da Páscoa, entre outros. Mas logo do lado existe outro grupo de ilhas, chamadas de "Melanésia", onde Fiji faz parte.
Pois bem, nesse conjunto de ilhas, nos séculos 19 e 20, houve um "intercâmbio" entre os exploradores europeus e norte-americanos com as tribos indígenas locais. Produtos trazidos por aviões eram trocados com os indígenas; produtos como chicletes e espelhos eram trocados por comida ou utilizados como moeda para pagamento de serviços -- como aconteceu em vários outros lugares do mundo em outros tempos.
Entretanto, nem tudo dura pra sempre e os explodores se foram, levando seus aviões, chicletes e espelhos.
Para as tribos da Melanésia, isso se tornou um problema. Como eles fariam para continuar conseguindo seus chicletes e espelhos?
A solução foi "simples": Eles fizeram seu próprio avião, com sua própria pista de vôo.
Não apenas isso, mas em algumas ilhas, é venerado o deus "John Frum", que voltará trazendo grandes maravilhas. E chicletes.
E agora você está rindo, achando "nossa, que bando de simplórios".
Bom, mas alguma vez você já ouviu alguém dizer...
- "Vamos usar X porque a Netflix usa."
ou
- "Faremos com Y porque é do Google."
ou ainda
- "No livro do Uncle Bob ele diz pra fazer assim."
Estes são exemplos básicos de cargo cult no meio da T.I. Quando as capacidades técnicas de alguma ferramenta (biblioteca, framework, linguagem, o que seja) é ignorado, baseando-se apenas na sua origem e/ou uso por causa de um nome, então temos um cargo cult -- a ideia de que, se fizermos como os outros fizeram ou da forma que outros falaram, teremos sucesso.
Obviamente, o fato do Netflix usar alguma coisa, ou ser feita pelo Google, ou ser indicado pelo Uncle Bob são fatores importante, mas não devem ser, nem de longe, o fator decisivo na escolha de uma tecnologia.
E só porque o Uncle Bob disse pra fazer assim, não quer dizer que fazendo assim você vai ter o retorno esperado -- porque seu problema pode não ser exatamente o problema que o Uncle Bob está resolvendo.
E só porque o Netflix usa, não quer dizer que usar a mesma tecnologia vá trazer o mesmo resultado -- a não ser que você esteja trabalhando na Netflix e fazendo o que a Netflix faz.
Por isso, tome cuidado quando alguém diz que vai ser utilizada alguma tecnologia pelos motivos acima. Eles podem ser critérios de desempate quando há mais de uma opção, mas eles não devem ser, nem de longe, o primeiro critério de aceitação.
A parte dos chicletes e John Frum pode ser vista no documentário Into the Inferno, de Werner Herzog.